terça-feira, 21 de outubro de 2008

de cinza radiante (ou como gostar de dias nublados)

Eu que sempre precisei do azul do céu para me ampliar me vejo contemplando o cinza radiante de dias nublados.

Mas eu sempre fui das belezas urgentes.

Posso ver beleza num galho seco que sombreia o céu azul. Posso ver beleza em cachos cor de rosa que aguardam o suporte do chão para renovar as folhas. E posso ver beleza num espinhaço de rochas retorcidas pela água de um rio que some e reaparece. 

Posso! 

Não que não haja beleza num céu cinza prateado de nuvens impelindo água. Mas eu sempre fui urgente do azul (com nuvens esparsas compondo suaves flocos de açúcar). Porque já sou de muito verde e vermelho (que trago embrenhados em mim); e essa terra de que sou feita (de sedimentos e territórios) e me deixa ocre. 

Mas o cinza, o cinza é novo! 

É novo esse contemplar. É novo o compartilhar. 

Eu que sempre me acostumei de temores, que sempre me precavi das perdas, que sempre me fiz invólucro das desilusões antevistas (prenunciadas). Me fiz exposta. 

Hoje percebo que há muito mais entre nós que eu poderia supor no saguão do Aeroporto de Congonhas, esperando a conexão para Florianópolis. Há muito mais que cachos acastanhados (um tanto preteados, olhando mais atentamente). Há muito mais que esse sorriso de engolir o espinhaço. 

Há essa inexplicável sensação de fatalidade (não no sentido fatal do termo). Esse sentir tão óbvio de que um estava no outro (só não nos conhecíamos). Esse sentir das coisas simples, o aproximado das desilusões (e o hábito de se desiludir). 

E principalmente, essa querência de entrega. Porque havia, amor, ainda que tentando se esconder por trás das certezas de objetividade e metas pré-definidas, que no fim sempre encontram uma pedra no caminho, pedra que de repente pode fazer esquentar – mais que os pés – a noite... 

Esse querer sublime e urgente de se sentir no outro. O ter de uma forma suave e ser retribuído com uma facilidade simples. O saber e (re)conhecer os olhos do outro (nos olhos). Esse olhar que vejo sempre, que reflete o sol refletido de lua, e reflete a lua. 

E a falta que não cabe na espera constante pelo retorno (mesmo quando ainda se está, quando ainda se espera a partida). 

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